sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Livre-arbítrio? Mas tu tá loco...

"Eu já me enchi desses homens-sim-senhor!
- Vou criar algo que tenha livre-arbítrio!"



Com licença, meus senhores, vai falar um blogueiro!

Serei direto, porque já é tarde e tenho que tirar um cochilo, pelo menos umas duas horinhas! Assunto polêmico nas atualidades, o livre-arbítrio foi posto à prova e, pra surpresa de muitos, melou.

A questão é simples. A resposta, nem tanto.

Temos capacidade de escolha: sim ou não? O que a gente pode falar, sem ter medo, é que temos a sensação de escolher o que fazemos. Mas o que sentimos não é necessariamente real. Por exemplo, quando vocês pegam um rabanete na mão, sentem como se estivessem encostando a pele na raiz, matéria na matéria. Acontece que não é verdade. A distância mínima que um corpo chega do outro é o Raio de Van der Waals, ou seja, não existe contato direto, só o resultado das interações eletrostáticas. Quando o vivente olha pra uma duna, parece que ela é totalmente recheada de areia, mas, na verdade, o que mais tem ali dentro são espaços vazios. Muito bem, adiante.

A experiência não confere sempre com a realidade, mas é importante pra nossa interação com o meio onde vivemos e do qual dependemos. Tendo em vista a importância disso, tá na cara que a seleção natural não ia amolecer pro lado dos que não sentiam nada. Pra demonstrar isso, é só dar uma olhada pros animais. Quase todos (e certamente, todos os mais abundantes) são dotados de órgãos de sentido. Sentem campos elétricos, ondas eletromagnéticas, ondas mecânicas, moléculas e otras cositas más.

A Bíblia diz e todo mundo sabe. Deus deu ao homem a capacidade de escolher o que faz. Acontece que tá se mostrando que não é bem assim, e eu vou explorar essa ideia de um jeito bem banal, que qualquer um é capaz de pensar.

Te imagina com uma decisão difícil: comprar um bagual crioulo ou fazer um puxadinho. O puxadinho tá fazendo falta, pois a patroa tá prenha de novo, e o varãozinho que tá pra nascer vai ser espaçoso que nem o pai. O cavalo é importante pra lida, vai ajudar a fazer uns bicos nos ranchos da região. Agora tu não sabe o que fazer. Vai começar a pensar no passado pra lembrar de histórias parecidas, nas vantagens de ter um cavalo, na história de alguém que ganhou filho recentemente, etc. A outra coisa que tu vai fazer é pensar no futuro, tentando prever o que pode acontecer se tu escolher uma coisa ou a outra. Essa capacidade de pensar no futuro a longo prazo é um diferencial importante dos homens. É difícil bicho que planeje tanto! Bom, vou dar o final da história. Tu vai escolher o puxadinho, porque, há dois anos, a mulher do João das Calhas teve filho, e eles tavam morando numa casinha de um quarto só. Acontece que a dita cuja ganhou o bebê e eles se acomodaram tudo no mesmo quarto. Daí o João anda puto da vida, pois disse que não tem mais intimidade com a patroa, que ela acha que abrir as pernas com o filho por perto é pecado. Imagina só! O cavalo a gente tenta conseguir emprestado, coisa e tal. Mas ficar dois anos ou mais sem uns amassos na querida, não tem como. Isso acaba com qualquer um.

Agora, a análise.

A decisão foi tomada. Aparentemente, o livre-arbítrio existe. É mesmo? Ou tudo o que tu fez foi condicionado por coisas as quais tu já tinha vivenciado? E se tivesse uma oportunidade de emprego boa que dependesse muito de um cavalo, tu ainda ia "escolher" o puxadinho? E se a tua mulher fosse um diabo feio, tua não ia achar bom ter uma trégua no rala-e-rola? Então, meu amigo. Tu agiu deterministicamente, boca-aberta. Pode parecer que tu tinha a capacidade de escolher, mas teu cérebro te lançou pro lado do puxadinho, pois a experiência armazenada que tu tinha dizia que isso era mais importante.

As escolhas tão determinadas por experiências anteriores e pela capacidade de planejamento.

Pra encerrar, que já to me estendendo demais. A sensação de ter tomado uma escolha acontece depois do teu cérebro ter te instruído a seguir um caminho. Não é muito intuitivo, eu sei, mas já tem um estudo provando isso.

Lógico que este artigo não tem a intenção de botar um ponto final na história. É um prelúdio da ópera, tô só iniciando a discussão e, confesso, de uma forma bem grosseira e pouco rigorosa. Tenho certeza que o companheiro Costa (Marcelão, também conhecido como Xiru Motoneta, Xiru Moranguinho e outros) vai se encarregar de escrever algo de melhor qualidade, mas, pra não deixar o blogue parado, vim aqui começar a peleia.

Agora nas férias, a coisa vai ficar meio devagar por aqui. Mas voltando o ritmo maluco do ano, as cousas vão se aprumando e tu vai ver mais conteúdo nessa budega. Já deixo aqui um incentivo ao companheiro Pimentel e ao Costa pra que escrevam. Tu também, que tá lendo aí. Se tiver vontade de escrever algo de acordo com a proposta desse blogue aqui, te esperta, é só falar comigo.

Um abraço do Pablito.

3 comentários:

  1. Muito bom texto, meu caro escritor real-regionalista. Conhecia um pouco desta teoria da escolha pré-determinada. De fato, intrigante. Gostei dos exemplos!
    Boa viagem tropeiro!

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  2. Chê, essa estória de experiência, cousa e tal ê comigo mesmo. Cierta bez andava nos rincões, lá pras bandas das coxilhas da minha estância véia fronteiriça e crioula (que báh!) y no me aparece um bagual escangalhado. E ficara me avistando de revesgueio, como quen no quer nada, pobre. No demora meaparece um guri de apartamento querendo montá de a cavalo. Eu le digo "si, pois entonces vem que me voi a te ponhá no lombo desse bagual" i o guri acordou, i eu le ponhei. Acontece que o bagual no resistiu i saiu tropando mais de pressa que vento minuano i o arigó galopeando, troteando todo esgualepado. Cuando estoporou no campo que fui le ver. Tava mais engraxado que telefone de açogueiro. Pois que aproveitei la situação i ainda le dei un descurso: "vês? no pode confear in cualquier um!"

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  3. Mas bah! Muito bom, che. Isso me dá ideias... Tem a bibliografia de onde tu tirou essas coisas? Logo logo faço um seguimento. Hasta!

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